terça-feira, 25 de março de 2014

MÃES HÁ MUITAS E PAIS HÁ POUCOS

Li no Público este texto que está maravilhoso, desculpem a dimensão do post, mas acho que merecia a vossa leitura.

"Ora então, pai é pai. Mas pai também é a mãe a valer por dois, o avô a encher o depósito de gasolina, a madrinha a beijar apertado, o mano mais velho a ir à frente. É que pai também só há um, ainda mais quando deu à sola, desapareceu, faleceu, viajou, cansou.

Um pai faz muita falta. Não conheço quem não tenha tido pai e que não o procure o resto da vida, à espera de poder gritar em alto e bom som aos amigos: “Olhem, este é o meu pai!”
 
Pai ausente ou pai fugido é como o Pai Natal: uma personagem de encantar que se finge acreditar que existe mesmo. Há quem acredite até aos 6 anos e há quem acredite a vida inteirinha que o pai vai aparecer, chaminé abaixo e com um presente de sonho na sacola. E claro, com uma explicação heróica que o impediu de estar presente: “Fui aprisionado pelas FARC!”, “Naufraguei todos estes anos” ou “Vivi no cimo de uma árvore à espera que o leão fosse embora. Mas pensei muito em ti”. Historitretas adiante.

O pai é o que está, fica, substitui ou aparece. O pai é quem vai à escola, sorrateiramente, mostrar o caparro a um miúdo de 5 anos que chateou o seu filho. O pai é quem ensina o primeiro palavrão ao filho, à filha e até ao cão. E o pai é ainda quem esclarece o filho que, no trânsito, aquele azelha estava mesmo a pedi-las. Ou seja, o pai costuma ser bom a ensinar o lado “pão pão, queijo queijo” da vida. E a mãe é boa a explicar que também há fiambre, já agora de perú e sem manteiga, meu amor.
 
Pai é paizinho para pedir dinheirinho e pai é paizão na hora de pedir perdão. Claro que os pais já não são o que eram. São melhores. Puxam mais rapidamente do coração do que do açoite de cinto de couro. Até porque o couro está mais caro que os afectos. Castigo do pai moderno, só depois de uma boa dose de conversa. “Filhote, deixa-me explicar-te novamente a teoria causa-efeito de fumares aos 9 anos.” Já se a criança não quer comer, o pai canta. Lá em casa, a versão é “Um aviãozinho militar / Atirou uma bomba ao ar / E ninguém sabe onde foi parar”. Facto é que a miúda abre a boca.
 
Pai tem três letrinhas apenas mas tão grandes como as da mãe porque o alfabeto é democrático. Já o Dia do Pai ainda se vive tendencialmente a pensar nos pais das crianças pequenas e na prendinha. Só que pai é pai até morrer e agora a esperança de vida anda maior. Temos muitos pais de 90 anos. Na China surgiu uma nova lei, duvido que funcione em termos práticos, que obriga os filhos adultos a visitarem os pais. Está certo que a China é grande como... a China, que não é o mesmo que ir ali num pulinho a Trás-os-Montes. E que os chineses, no que toca a leis de controlo familiar, vou ali e não volto... Mas o facto é que, seja na China ou em Portugal, não está certo os filhos não visitarem os pais. Para o ano, aprovava uma campanha “No Dia do Pai, visite-o”. Sempre é melhor do que inventar. Presentes.
 
Também há pais com um coração tão grande que criam os filhos de outros. Sem o saberem. Um estudo britânico, há quase uma década atrás, apresentava como resultado estatístico que quase 1 em cada 25 pais testados não era o pai verdadeiro do seu filho. Se pensar que as estatísticas são só a ponta do icebergue, imagino que hajam pelo mundo inteiro muitos filhos criados por pais que não são biologicamente seus. E que ninguém sabe disso, excepto a mamã. Malandra.
 
Mas já que há Dia do Pai, que se celebre aos que estão, pois é como diz o ditado: "só faz falta quem está". Porque pai é quem cria."

Por Sofia Anjos in Publico

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